Campos Neto diz que todos precisam ceder para reduzir juros de cartão
Para ele, “debate deve ser amplo junto com o Ministério da Fazenda”
O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, afirmou, nesta quinta-feira (28), que “cada um precisa ceder um pouco” para a regulamentação dos juros do crédito rotativo do cartão de crédito.
A modalidade é uma das mais altas do mercado e chegou a 445,7% ao ano em agosto, para pessoas físicas, enquanto a média das taxas do cartão de crédito ficou em 101,5% ao ano.
“A gente precisa todo mundo sentar, discutir e falar: ‘olha a solução é uma solução onde cada um precisa ceder um pouco’. Esse debate tem que ser muito mais amplo, junto com o Ministério da Fazenda”, disse durante entrevista coletiva na sede do BC, em Brasília, para apresentação do Relatório Trimestral da Inflação.
Para Campos Neto, é importante deixar claro que o principal problema é que o aumento da carteira de crédito vem acompanhado por “uma inadimplência cada vez mais alta e com uma taxa de cada vez mais alta. “Isso, eventualmente, pode incorrer um problema para as pessoas e para o consumo, então ‘não fazer nada’ também é um problema. A gente precisa achar uma solução mais estrutural”, explicou.
Cartão de crédito
O rotativo é o crédito tomado pelo consumidor quando paga menos que o valor integral da fatura do cartão de crédito e dura 30 dias. Após os 30 dias, as instituições financeiras parcelam a dívida. Nesse caso do cartão parcelado, os juros ficaram em 194,5% ao ano em agosto.
Hoje, a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado Federal aprovou projeto que limita os juros do crédito rotativo. O texto prevê que - depois de aprovada e publicada a lei - as empresas emissoras de cartão terão 90 dias para encaminhar ao Conselho Monetário Nacional (CMN) uma proposta de regulamentação com a definição desse teto.
Caso contrário, ficou decidido que os juros não poderão ser maiores que o valor original da dívida. Ou seja, juros de 100% e não de mais de 400% ao ano como é cobrado hoje. O texto já passou pela Câmara dos Deputados e precisa ser aprovado no plenário do Senado antes de ser sancionado pelo presidente da República e virar lei.
O CMN é composto, além do presidente do Banco Central, pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e pela ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet.
As altas taxas dos juros já eram objeto de estudo pelo Banco Central e pelas próprias instituições financeiras.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) já se manifestou criticando o limite de juros para o rotativo, pois poderia tornar os cartões inviáveis e reduzir a oferta de crédito. A entidade espera encontrar uma solução no mercado no prazo previsto pela lei, se aprovada.
Nas discussões, os bancos afirmam que os juros da modalidade rotativa são altos porque financiam o parcelamento de compras sem juros no cartão de crédito, que impacta diretamente no custo de capital, no risco de crédito e na inadimplência. Entretanto, para a Febrabran, “não há qualquer pretensão de se acabar com as compras parceladas”.
Segundo Campos Netos, uma possível limitação ou taxação do parcelamento de compras é um tema que também vai ser discutido no CMN e que já teve “forte resistência de vários setores”.
“O que a gente vai tentar fazer nesses 90 dias [é] uma reunião com todos os setores, com todos os envolvidos para ver se a gente consegue buscar uma solução que seja mais estrutural de longo prazo”, disse.
Mobilização de servidores
Durante a entrevista coletiva, os servidores do Banco Central compareceram ao auditório em protesto. Eles reivindicam a restruturação da carreira e criação de um bônus de produtividade semelhante ao que foi regulamentado para os auditores da Receita Federal.
Campos Neto manifestou apoio à mobilização da categoria e se comprometeu, em nome da diretoria colegiada do BC, a “fazer todo o possível para corrigir as distorções e para valorizar a carreira”.
“Os servidores foram são e sempre serão muito importantes. O corpo diretor às vezes pode mais ou menos dar o direcionamento, mas os servidores fazem o trabalho”, disse, citando diversos trabalhos que a autoridade monetária vem realizando nos últimos anos, como lançamento do PIX mesmo em meio à pandemia de covid-19.
Desde julho deste ano, o sindicato da categoria está em mobilização e os servidores realizam operação padrão, na qual os trabalhos são realizados de forma mais lenta. Em razão disso, a divulgação de diversos indicadores econômicos sofre atrasos ou deixa de ser feita.
“É importante valorizar a carreira no Banco Central. Eu tenho dito isso desde o começo, sempre reconhecemos, na Diretoria Colegiada, as assimetrias. Esse foi um ponto que até gerou bastante frustração porque nós não conseguimos corrigir o que a gente tinha detectado desde o começo, de assimetria. Mas a gente reconhece que é importante, eu acho que agora é mais do que nunca a hora de todos lutarem juntos para valorizar a carreira do Banco Central”, finalizou Campos Neto.