Fogo Cruzado mapeou 12 chacinas em área onde médicos foram mortos
Ao todo, 43 pessoas foram assassinadas na região
Apenas em 2023, a zona oeste do Rio de Janeiro já registrou 12 chacinas. É o que aponta levantamento do Instituto Fogo Cruzado, que contabiliza os assassinatos de três médicos ocorridos na madrugada desta quinta-feira (5), em um quiosque na Avenida Lúcio Costa, na Barra da Tijuca.
As 12 chacinas mapeadas deixaram 43 mortos. A zona oeste responde por um terço das chacinas registradas ao longo do ano no Rio de Janeiro: ao todo foram 37 casos, que tiraram a vida de 141 pessoas. A morte dos médicos, no entanto, é a primeira ocorrência do tipo anotada este ano especificamente na Barra da Tijuca.
Dos 12 casos registrados na zona oeste, sete estariam relacionadas com operações policiais. Dessa forma, a morte dos médicos seria a quinta chacina na região não relacionada com nenhuma operação policial.
Entre as vítimas, estavam Diego Ralf Bomfim, irmão da deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP). Além dele, Marcos de Andrade Corsato e Perseu Ribeiro Almeida morreram no local. Um quarto médico ficou ferido e foi encaminhado ao Hospital Municipal Lourenço Jorge, na Barra da Tijuca.
As vítimas atuavam fora do estado do Rio de Janeiro e estavam na cidade para participar de um congresso internacional de cirurgia ortopédica. O quiosque onde eles foram assassinados fica próximo ao hotel onde é realizado o congresso.
Por determinação do Ministério da Justiça, a Polícia Federal atua na investigação do caso. Sâmia Bomfim assinou uma nota, junto com colegas de legenda, incluindo seu marido e também deputado Glauber Braga (PSOL-RJ).
Eles cobraram “imediata e profunda investigação para descobrir as motivações”. O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) também se manifestou lamentando as mortes e pedindo rigor nas investigações.
Mapeamento
O Fogo Cruzado surgiu inicialmente como um aplicativo desenvolvido pela Anistia Internacional e lançado em 2016 para monitoramento de tiroteios e seus impactos na região metropolitana do Rio de Janeiro. Foi sendo aprimorado, convertendo-se em uma plataforma capaz de reunir diversos indicadores sobre violência armada. Em 2018, o projeto passou a ter uma gestão independente, e, com o tempo, estendeu-se para incorporar as regiões metropolitanas de Recife e Salvador.
Para fornecer informações que possam auxiliar o planejamento de políticas de segurança pública eficazes, o Fogo Cruzado apresenta levantamentos eventuais e um relatório anual com dados do seu monitoramento. Para o mapeamento das chacinas, o instituto considera eventos onde há três ou mais mortos civis em uma mesma situação, mesmo que o motivo dos disparos seja diverso, envolvendo por exemplo assalto, ataque, operação policial e outros casos.
Este é um conceito que pode variar de pesquisa para pesquisa. Originalmente, chacina designa uma técnica de abate de porcos em matadouros. Na linguagem popular, ela foi ressignificada para designar a ocorrência simultânea de diversos crimes de homicídios. Mas trata-se de um termo sem conotação jurídica.
Há pesquisadores que não adotam um conceito meramente estatístico para chacinas, delimitando-o também a partir de questões como motivação, premeditação e alvos. Alguns especialistas consideram que chacinas envolvem sempre vítimas em condição de vulnerabilidade.
História
O termo chacina passou a ser mais utilizado a partir da década de 1990, quando diversos episódios registrados no Rio de Janeiro ganharam os noticiários do país.
Em julho de 1993, por exemplo, oito moradores de rua foram executados enquanto dormiam em frente à Igreja da Candelária. Um mês depois, 22 moradores da favela de Vigário Geral foram mortos dentro de suas casas.
No ano seguinte, policiais mataram 13 pessoas na comunidade Nova Brasília, no Complexo do Alemão. No restante do país, chacinas também foram anotadas no período como os massacres do Carandiru, em 1992, e de Eldorado do Carajás, em 1996.
Mais recentemente, o Rio de Janeiro tem registrado um aumento do número de chacinas associadas a operações policiais. Em 2021, a comunidade do Jacarezinho acusou um episódio emblemático: 28 pessoas morreram na incursão de policiais civis, considerada a mais letal da história do Rio de Janeiro. Segundo levantamento do Fogo Cruzado, das 37 chacinas mapeadas em 2023, 22 - quase 60% - ocorreram durante ações ou operações policiais.